domingo, 1 de novembro de 2009

O Universo dos Paradoxos



A vida é breve, a alma é vasta. FERNANDO PESSOA

A complexidade do mundo e a da vida se apresentam de inúmeras formas. Entre as mais frequentes estão os paradoxos, situações de impasse, circunstâncias nas quais os contrários não podem ser conciliados, mas mesmo assim precisam permanecer juntos.

Os paradoxos começam em nós próprios, humanos, seres ao mesmo tempo racionais e irracionais. Fazemos tudo para aparentar que somos sempre guiados pela razão, mas a experiência e as descobertas da neurociência mostram que nossas percepções começam com as emoções.

Somos ambíguos e vivemos, a todo momento, situações incertas, indefinidas, circunstâncias que nossa lógica habitual gostaria de eliminar, mas continuam presentes – e de nada adianta fingir que elas não existem.

Saber lidar com os paradoxos é saber lidar com a indefinição, a incerteza, a instabilidade
– com a complexidade, enfim. Esse é o nosso desafio cotidiano. Como foi dito há pouco, de nada adianta fingir que a incerteza e a imprevisibilidade não existem. Pior ainda é pensar que elas só existem fora de nós. Esse é um equívoco muito frequente: projetar nos outros uma ambiguidade que seguramente existe neles, mas que também, com certeza, existe em nós. É indispensável, portanto, que aprendamos a lidar com a nossa própria ambiguidade, que com frequência se manifesta como hesitação e dificuldade de tomar decisões.

Para tanto, porém, é preciso aprender a lidar com os fatores há pouco referidos. É necessário integrá-los, aprender a pensar também de modo inclusivo e não apenas de maneira fragmentadora, segundo o padrão da nossa cultura.

O pensamento complexo visa ajuntar coisas, pessoas e situações, para que de sua interação surjam idéias novas. Mas procura fazer isso sem perda da condição de individualidade, da singularidade de cada coisa e situação. Costumo repetir que estas são expressões e situações óbvias, e que, portanto, teoricamente não haveria necessidade de mencioná-las. Infelizmente, porém, a experiência mostra que quanto mais óbvias são as coisas, mais difícil é a sua percepção.

Aliás, a negação do óbvio é uma das principais características da chamada sabedoria convencional. Um exemplo é nossa tendência a evitar as idéias que contrariam nossas convicções mais arraigadas. Em geral, nosso primeiro impulso é não levar em consideração aquilo com que não concordamos. A princípio, essa parece ser uma atitude lógica e coerente: se nos sentimos desconfortáveis, não pensamos duas vezes: eliminamos o desconforto, fugimos dele o mais rápido possível. Ao fazer isso, com frequência, perdemos boas oportunidades de perguntar a nós mesmos: se nossas idéias, convicções e pontos de vista são tão corretos e sólidos, por que temos tanto receio de pô-los à prova?

Muitas vezes, é necessário dar atenção a pessoas e idéias das quais discordamos com veemência. Tal atitude produz um cotejo de opostos, o qual, por sua vez, estabelece uma tensão criativa, da qual podem emergir idéias e soluções que dificilmente surgiriam de outra maneira. Esse talvez seja um dos aspectos menos compreendidos da aprendizagem.

[...]
MARIOTTI,Humberto. PENSAMENTO COMPLEXO: Suas Aplicações à Liderança, a Aprendizagem e ao Desenvolvimento Sustentável. 1ª. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2007.

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